Viciados em jogos eletrônicos estão virando uma questão mundial de saúde pública
Giselle Torres Biaco
Há muito tempo que a influência das mídias eletrônicas no comportamento de crianças e adolescentes é alvo de pesquisas, estudos acadêmicos e discussões entre pais e educadores.
Uma reportagem apresentada no dia 24 pelo Domingo Espetacular, da TV Record, teve como alvo a crítica aos games violentos que, de acordo com a emissora, teriam influenciado o atirador e contribuído para o desfecho trágico do massacre na escola de Realengo (RJ). Esta posição contrária aos jogos acirrou ainda mais a velha questão, provocando novas discussões e controvérsias.
Para a psicóloga rio-pardense Tatiane Cafola Bastos, no caso específico de games violentos, a criança pode apresentar mudança de comportamento, o que não significa que ela se tornará assassina, como no caso do jovem do Rio de Janeiro. “Na fase de crescimento e amadurecimento mental, a percepção da vida e o significado dos jogos é diferente para cada uma delas. A personalidade do jovem de Realengo era esquizofrênica, dizem que ele teria sofrido bullying na escola. A sensação de poder que os games promovem, associado ao que o indivíduo é, acabou gerando a tragédia.”
Tatiane explica que a criança, em torno dos sete ou oito anos (essa idade pode variar de uma para outra), não sabe ainda diferenciar fantasia e realidade. “O herói mata o sujeito do mal ou vice-versa; em outro momento a criança desliga o game e a vida continua. É aí que os problemas começam a aparecer, nesse imaginário fantasioso.”
O web designer Douglas Soares Martins, de 19 anos, um apaixonado convicto por games, acredita que a violência apresentada em alguns jogos somados à esquizofrenia e ao bullying podem ter influenciado as ações do jovem de Realengo. “O problema é quando culpamos apenas o fato de se jogar jogos violentos. Na minha visão um jogo violento influencia tanto quanto um filme violento exibido na TV (Tropa de Elite, por exemplo), ou até mesmo jogos de futebol. Quantas vezes já não vemos partidas de futebol onde torcidas rivais se matam ou saem pelas ruas destruindo tudo? Será que foi o futebol que influenciou? Ou é isso somado a algum problema pessoal ou até mesmo mental que deveria estar em evidência?”
Paixão ou vício?
Viciados em jogos eletrônicos estão virando uma questão mundial de saúde pública, tanto que clínicas de reabilitação específicas para este tipo de vício estão sendo construídas em vários países.
Em 2008, um adolescente de 15 anos de idade sofreu um colapso e entrou em convulsão depois de jogar um videogame durante 24 horas seguidas em sua casa, no sul da Suécia. No hospital, os médicos que o atenderam disseram que o colapso foi resultado de uma combinação de falta de sono, falta de alimentação adequada e tempo excessivo sob estresse, devido à sua concentração no jogo. Outros casos semelhantes já ocorreram depois disso, ao redor do mundo.
Os jogos eletrônicos estão cada vez mais sofisticados e violentos. Em alguns dos games mais modernos, é possível arrancar a cabeça do adversário junto com a coluna vertebral. Em jogos com armas de fogo, o jogador pode assassinar inocentes a tiros pelas ruas, numa macabra imitação de casos reais.
No Brasil, o Ministério da Justiça já proibiu a venda do Carmageddon, cujo objetivo é atropelar velhinhas e crianças. A ciência não tem dúvidas de que o sadismo virtual faz mal aos jovens. Tatiane cita o caso de uma criança de seis anos que entrou em pânico por conta dos games que o irmão gosta de jogar. “Em todo o seu cotidiano ela não fica sozinha por um momento sequer, a mãe ou outra pessoa tem que estar por perto. A criança tem a sensação de que o monstro vai invadir a qualquer momento e pegar todos.”
O web designer Douglas diz que joga desde criança, tendo começado o que ele considera como “hobby” com os ingênuos Super Mario World e Sonic. “Ultimamente costumo jogar alguns jogos violentos, não são meus preferidos, porém gosto de estar por dentro de toda novidade que sai no mercado, comparando e analisando profundamente cada game”, declara. Ele conta que quando era mais novo costumava jogar por um período de 5 a 6 horas por dia, mas que hoje, por estar trabalhando, essa média caiu para 1 ou 2 horas diárias.
Ele diz que se considera um apaixonado por games, já que está sempre tentando saber e adquirir novidades. “É o que gosto de fazer no dia-a-dia e de colecionar na prateleira e na memória. De certa forma, essa paixão passa a ser algo normal desde que você saiba o que está jogando, a grande maioria de jogos são completamente em inglês, isso sempre traz um bloqueio para certas pessoas de saber o que se ocorre na história do jogo. A partir de um momento que você sabe quem você é como personagem, o que se passa à sua volta e seu objetivo, o jogo começa a fazer sentido e alguns se tornam tão bons quanto um filme premiado. Não é à toa que temos tantos filmes baseados em jogos”, defende Douglas.
Televisão e computador
“Vivemos cercados por informações de todos os lados e as crianças a cada dia convivem mais e mais com formas avançadas de tecnologia”, declara Tatiane. Para ela, a televisão pode interferir de maneira negativa na vida de crianças e adolescentes, uma vez que eles deixam de praticar seus esportes, de se socializar. “A televisão é um atrativo que seduz e vicia e a criança não tem a discriminação do certo e errado.”
Estudos explicam que os meios eletrônicos provêm uma imagem virtual fora da realidade e que pode, assim, haver uma inversão: em lugar de a criança associar a imagem exibida no aparelho com algo que ela conhece do mundo real, fazer a associação do que observa no mundo real com a imagem que viu no aparelho. Nesse sentido, há um caso mencionado pelo professor doutor titular do departamento de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística da USP, Valdemar W. Setzer, numa de suas obras literárias. “Em uma palestra, uma pessoa contou-me que conhecia uma história real de uma menina pequena que viu um leão e, em lugar de ficar com medo, correu para “brincar” com ele, pois estava vendo um seriado na TV onde havia um leão bonzinho, tendo obviamente sido estraçalhada. Nesse caso, ocorreu justamente a inversão citada. É a inversão da fantasia com a realidade. Isso não é educação, é literalmente uma antieducação!”
“O computador pode até ser bom se corretamente utilizado. Dependo da faixa etária, o ideal é utilizar ferramentas de bloqueio pelo bem daquele adolescente, isso sem se esquecer de importância do diálogo”, sugere Tatiane.
Limite é a resposta
A psicóloga explica que os pais devem ensinar seus filhos a utilizar a televisão, o computador e o videogame com inteligência, da mesma forma que se ensina que “a porta da geladeira não deve ficar aberta por muito tempo”. “Estes instrumentos não trazem apenas influências negativas, mas também são benéficos para estudos, pesquisas e entretenimento de forma sadia.”
Para crianças acima de dois anos de idade, ela informa que os pais devem impor um limite de aproximadamente duas horas diárias, intercaladas com outras atividades. “Cada criança tem seu tempo para deixar de viver entre a realidade e a fantasia, e isso acontece de acordo com o estágio de desenvolvimento de cada uma. A partir do momento em que desvenda a fantasia, também aprende a lidar com o mundo real”, diz.
Uma dica importante para os pais é ficar atento a mudanças de comportamento da criança ou adolescente, como insônia, depressão, pesadelos, isolamento, bem como atitudes que podem estar sendo influenciadas pelo “excesso” de tecnologia. “Esta é a hora de parar e rever o que deve ser mudado na rotina dessa criança, para que se possa inverter a situação enquanto há tempo”, conclui. Foto legenda 1: A psicóloga Tatiane acredita que jogos violentos podem influenciar o comportamento de crianças e adolescentes
Há muito tempo que a influência das mídias eletrônicas no comportamento de crianças e adolescentes é alvo de pesquisas, estudos acadêmicos e discussões entre pais e educadores.
Uma reportagem apresentada no dia 24 pelo Domingo Espetacular, da TV Record, teve como alvo a crítica aos games violentos que, de acordo com a emissora, teriam influenciado o atirador e contribuído para o desfecho trágico do massacre na escola de Realengo (RJ). Esta posição contrária aos jogos acirrou ainda mais a velha questão, provocando novas discussões e controvérsias.
Para a psicóloga rio-pardense Tatiane Cafola Bastos, no caso específico de games violentos, a criança pode apresentar mudança de comportamento, o que não significa que ela se tornará assassina, como no caso do jovem do Rio de Janeiro. “Na fase de crescimento e amadurecimento mental, a percepção da vida e o significado dos jogos é diferente para cada uma delas. A personalidade do jovem de Realengo era esquizofrênica, dizem que ele teria sofrido bullying na escola. A sensação de poder que os games promovem, associado ao que o indivíduo é, acabou gerando a tragédia.”
Tatiane explica que a criança, em torno dos sete ou oito anos (essa idade pode variar de uma para outra), não sabe ainda diferenciar fantasia e realidade. “O herói mata o sujeito do mal ou vice-versa; em outro momento a criança desliga o game e a vida continua. É aí que os problemas começam a aparecer, nesse imaginário fantasioso.”
O web designer Douglas Soares Martins, de 19 anos, um apaixonado convicto por games, acredita que a violência apresentada em alguns jogos somados à esquizofrenia e ao bullying podem ter influenciado as ações do jovem de Realengo. “O problema é quando culpamos apenas o fato de se jogar jogos violentos. Na minha visão um jogo violento influencia tanto quanto um filme violento exibido na TV (Tropa de Elite, por exemplo), ou até mesmo jogos de futebol. Quantas vezes já não vemos partidas de futebol onde torcidas rivais se matam ou saem pelas ruas destruindo tudo? Será que foi o futebol que influenciou? Ou é isso somado a algum problema pessoal ou até mesmo mental que deveria estar em evidência?”
Paixão ou vício?
Viciados em jogos eletrônicos estão virando uma questão mundial de saúde pública, tanto que clínicas de reabilitação específicas para este tipo de vício estão sendo construídas em vários países.
Em 2008, um adolescente de 15 anos de idade sofreu um colapso e entrou em convulsão depois de jogar um videogame durante 24 horas seguidas em sua casa, no sul da Suécia. No hospital, os médicos que o atenderam disseram que o colapso foi resultado de uma combinação de falta de sono, falta de alimentação adequada e tempo excessivo sob estresse, devido à sua concentração no jogo. Outros casos semelhantes já ocorreram depois disso, ao redor do mundo.
Os jogos eletrônicos estão cada vez mais sofisticados e violentos. Em alguns dos games mais modernos, é possível arrancar a cabeça do adversário junto com a coluna vertebral. Em jogos com armas de fogo, o jogador pode assassinar inocentes a tiros pelas ruas, numa macabra imitação de casos reais.
No Brasil, o Ministério da Justiça já proibiu a venda do Carmageddon, cujo objetivo é atropelar velhinhas e crianças. A ciência não tem dúvidas de que o sadismo virtual faz mal aos jovens. Tatiane cita o caso de uma criança de seis anos que entrou em pânico por conta dos games que o irmão gosta de jogar. “Em todo o seu cotidiano ela não fica sozinha por um momento sequer, a mãe ou outra pessoa tem que estar por perto. A criança tem a sensação de que o monstro vai invadir a qualquer momento e pegar todos.”
O web designer Douglas diz que joga desde criança, tendo começado o que ele considera como “hobby” com os ingênuos Super Mario World e Sonic. “Ultimamente costumo jogar alguns jogos violentos, não são meus preferidos, porém gosto de estar por dentro de toda novidade que sai no mercado, comparando e analisando profundamente cada game”, declara. Ele conta que quando era mais novo costumava jogar por um período de 5 a 6 horas por dia, mas que hoje, por estar trabalhando, essa média caiu para 1 ou 2 horas diárias.
Ele diz que se considera um apaixonado por games, já que está sempre tentando saber e adquirir novidades. “É o que gosto de fazer no dia-a-dia e de colecionar na prateleira e na memória. De certa forma, essa paixão passa a ser algo normal desde que você saiba o que está jogando, a grande maioria de jogos são completamente em inglês, isso sempre traz um bloqueio para certas pessoas de saber o que se ocorre na história do jogo. A partir de um momento que você sabe quem você é como personagem, o que se passa à sua volta e seu objetivo, o jogo começa a fazer sentido e alguns se tornam tão bons quanto um filme premiado. Não é à toa que temos tantos filmes baseados em jogos”, defende Douglas.
Televisão e computador
“Vivemos cercados por informações de todos os lados e as crianças a cada dia convivem mais e mais com formas avançadas de tecnologia”, declara Tatiane. Para ela, a televisão pode interferir de maneira negativa na vida de crianças e adolescentes, uma vez que eles deixam de praticar seus esportes, de se socializar. “A televisão é um atrativo que seduz e vicia e a criança não tem a discriminação do certo e errado.”
Estudos explicam que os meios eletrônicos provêm uma imagem virtual fora da realidade e que pode, assim, haver uma inversão: em lugar de a criança associar a imagem exibida no aparelho com algo que ela conhece do mundo real, fazer a associação do que observa no mundo real com a imagem que viu no aparelho. Nesse sentido, há um caso mencionado pelo professor doutor titular do departamento de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística da USP, Valdemar W. Setzer, numa de suas obras literárias. “Em uma palestra, uma pessoa contou-me que conhecia uma história real de uma menina pequena que viu um leão e, em lugar de ficar com medo, correu para “brincar” com ele, pois estava vendo um seriado na TV onde havia um leão bonzinho, tendo obviamente sido estraçalhada. Nesse caso, ocorreu justamente a inversão citada. É a inversão da fantasia com a realidade. Isso não é educação, é literalmente uma antieducação!”
“O computador pode até ser bom se corretamente utilizado. Dependo da faixa etária, o ideal é utilizar ferramentas de bloqueio pelo bem daquele adolescente, isso sem se esquecer de importância do diálogo”, sugere Tatiane.
Limite é a resposta
A psicóloga explica que os pais devem ensinar seus filhos a utilizar a televisão, o computador e o videogame com inteligência, da mesma forma que se ensina que “a porta da geladeira não deve ficar aberta por muito tempo”. “Estes instrumentos não trazem apenas influências negativas, mas também são benéficos para estudos, pesquisas e entretenimento de forma sadia.”
Para crianças acima de dois anos de idade, ela informa que os pais devem impor um limite de aproximadamente duas horas diárias, intercaladas com outras atividades. “Cada criança tem seu tempo para deixar de viver entre a realidade e a fantasia, e isso acontece de acordo com o estágio de desenvolvimento de cada uma. A partir do momento em que desvenda a fantasia, também aprende a lidar com o mundo real”, diz.
Uma dica importante para os pais é ficar atento a mudanças de comportamento da criança ou adolescente, como insônia, depressão, pesadelos, isolamento, bem como atitudes que podem estar sendo influenciadas pelo “excesso” de tecnologia. “Esta é a hora de parar e rever o que deve ser mudado na rotina dessa criança, para que se possa inverter a situação enquanto há tempo”, conclui. Foto legenda 1: A psicóloga Tatiane acredita que jogos violentos podem influenciar o comportamento de crianças e adolescentes
Nenhum comentário:
Postar um comentário